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Mãe Menininha do Gantois

Mãe Menininha do Gantois

Maria Escolástica da Conceição Nazaré, conhecida como Mãe Menininha do Gantois (Salvador, Bahia, 10 de fevereiro de 1894 – 13 de agosto de 1986), foi uma Iyálorixá (mãe-de-santo) brasileira, filha de Oxum. É a mais famosa ialorixá da Bahia e uma das mais admiradas mães-de-santo do país.[1] Foi empossada como ialorixá aos 28 anos, em 18 de fevereiro de 1922.[2]

Mãe Menininha do Gantois
Nome completo Maria Escolástica da Conceição Nazaré
Nascimento 10 de fevereiro de 1894
Salvador, Bahia
Morte 13 de agosto de 1986 (92 anos)
Salvador, Bahia
Nacionalidade brasileira

Biografia

Maria Escolástica nasceu em Salvador, em 1894, no dia de Santa Escolástica, na Rua da Assembléia, entre a Rua do Tira Chapéu e a Rua da Ajuda, no Centro Histórico de Salvador, tendo como pais Joaquim e Maria da Glória Nazareth. Descendente de escravizados africanos, ainda criança foi escolhida para ser Iyálorixá (mãe-de-santo) do terreiro Ilê Iyá Omi Axé Iyamassê, fundado em 1849 por sua bisavó, Maria Júlia da Conceição Nazaré, cujos pais eram originários de Agbeokuta, sudoeste da Nigéria.

Foi apelidada de Menininha, talvez por seu aspecto franzino:

Foi iniciada no culto dos orixás de Keto aos 8 anos de idade por sua tia-avó e madrinha de batismo, Pulchéria Maria da Conceição (Mãe Pulchéria), chamada Kekerê – em referência à sua posição hierárquica, Iyá kekerê(Mãe pequena).[4] Menininha seria sua sucessora na função de Iyalorixá do Gantois. Com a morte repentina de Mãe Pulchéria, em 1918, o processo de sucessão foi acelerado. Por um curto período, enquanto a jovem se preparava para assumir o cargo, sua mãe biológica, Maria da Glória Nazareth, permaneceu à frente do Gantois.[3]

Foi a quarta Iyálorixá do Terreiro do Gantois e a mais famosa de todas as Iyálorixá brasileiras. Sucessora de sua mãe, Maria da Glória Nazareth, foi sucedida por sua filha, Mãe Cleusa Millet, que morreu em 16 de outubro de 1998.[5]

O terreiro, que inicialmente funcionava na Barroquinha, na zona central de Salvador, foi posteriormente, transferido para o bairro da Federação onde hoje é o Ilê Axé Iyá Nassô Oká, na Avenida Vasco da Gama, do qual Maria Júlia da Conceição Nazaré sua avó também fazia parte. Com o falecimento da iyalorixá da Casa Branca Iyá Nassô, sucedeu Iyá Marcelina da Silva Oba Tossi. Após a morte desta, Maria Júlia da Conceição e Maria Júlia Figueiredo, disputaram a chefia do candomblé, cabendo à Maria Júlia Figueiredo que era a substituta legal (Iyakekerê) tomar a posse como Mãe do Terreiro.[3][4]

Maria Júlia da Conceição afastou-se com as demais dissidentes e fundaram outra Ilé Axé, o (Terreiro do Gantois), instalando-se em terreno arrendado aos Gantois – família de traficantes de escravos e proprietários de terras de origem belga – pelo cônjuge de Maria Júlia, o negro alforriado Francisco Nazareth de Eta.[7] Situado num lugar alto e cercado por um bosque, o local de difícil acesso era bem conveniente numa época em que o candomblé era perseguido pelas forças da ordem. Geralmente, os rituais terminavam subitamente com a chegada da polícia.[8]

Em 1922, através do jogo de búzios, os orixás Oxóssi, Xangô, Oxum e Obaluaiyê confirmaram a escolha de Menininha, então com 28 anos. Em 18 de fevereiro daquele ano, ela assume definitivamente o terreiro.

A partir da década de 1930, a perseguição ao candomblé vai arrefecendo, mas uma Lei de Jogos e Costumes, condicionava a realização de rituais à autorização policial, além de limitar o horário de término dos cultos às 22 horas. Mãe Menininha foi uma das principais articuladoras do término das restrições e proibições. “Isso é uma tradição ancestral, doutor”, ponderava a iyalorixá diante do chefe da Delegacia de Jogos e Costumes. “Venha dar uma olhadinha o senhor também.”[4]

Mãe Menininha abriu as portas do Gantois aos brancos e católicos – uma abertura que, em muitos terreiros, ainda é vista com certo estranhamento. Mas afinal, a Lei de Jogos e Costumes foi extinta em meados dos anos 1970. “Como um bispo progressista na Igreja Católica, Menininha modernizou o candomblé sem permitir que ele se transformasse num espetáculo para turistas”, analisa o professor Cid Teixeira, da Universidade Federal da Bahia.[4]

[1][2][3][4]

Nunca deixou de assistir à missa e até convenceu os bispos da Bahia a permitir a entrada nas igrejas de mulheres, inclusive ela, vestidas com as roupas tradicionais do candomblé.[9]

Vida pessoal

Aos 29 anos, Menininha casou-se com o advogado Álvaro MacDowell de Oliveira, descendente de escoceses. Com ele teve duas filhas, Cleusa e Carmem.[5]

Em uma entrevista à revista IstoÉ, mãe Carmem conta que ela adorava assistir telenovelas, sendo que uma de suas preferidas teria sido Selva de Pedra.[11] Era colecionadora de peças de porcelana, louça e de cristais, que guardava muito zelo. Não bebia Coca-Cola, pois certa vez lhe disseram que a bebida servia para desentupir os ralos de pias, e ela temia que a ingestão da bebida fizesse efeito análogo em si.[11]

Morte

Mãe Menininha morreu em Salvador, em 13 de agosto de 1986, de causas naturais, aos 92 anos de idade.[1][2]

Homenagens

O terreiro está localizado na rua Mãe Menininha do Gantois (antiga rua da Boa Vista, renomeada em 1986),[6] no Alto do Gantois, bairro da Federação, em Salvador. Após a sua morte, seus filhos deixaram seu quarto intacto, com seus objetos de uso pessoal e ritualísticos. O aposento foi transformado no Memorial Mãe Menininha e é uma das grandes atrações do Gantois.

Mãe Menininha, aos 8 anos de idade.

No ano de 1976, foi homenageada pela Escola de Samba carioca Mocidade Independente de Padre Miguel, com o enredo “Mãe Menininha do Gantois”, do carnavalesco Arlindo Rodrigues. O samba foi interpretado pela cantora Elza Soares e o puxador Ney Vianna:

Já raiou o dia
A passarela vai se transformar
Num cenário de magia
Lembrando a velha Bahia
E o famoso Gantois

Arerê, arerá
Candomblé vem da Bahia
Onde baixam os orixás

Oh, meu pai Ogum na sua fé
Saravá Nanã e Oxumaré
Xangô, Oxossi
Oxalá e Yemanjá
Filha de Oxum
Pra nos ajudar
Vem nos dar axé
Com os erês dos orixás

Refrão
Oh, minha mãe
Menininha
Vem ver, como toda cidade
Canta em seu louvor com a Mocidade

A agremiação ficou em terceiro lugar e Mãe Menininha, apesar da idade, se fez presente e ajudou com o “pedido” de licença para realização do enredo, junto aos Orixás.[12]

Há também uma homenagem à Mãe Menininha na música “Bahia, minha preta” composta por Veloso e bastante ouvida na voz de Gal Costa, parte do seu álbum “O Sorriso do Gato de Alice”, de 1993. A música canta:

“(…) Te chamo de senhora Opô, afonjá Eros, Dona Lina, Agostinho e Edgar Te chamo Menininha do Gantoise Candolina, Marta, Didi, Dodô e Osmar na linha romântico (…)”

Preconceito

Em 10 de abril de 2013, foi divulgado na internet polêmico vídeo em que o pastor e deputado Marco Feliciano,[13] então presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, se referiu à Mãe Menininha do Gantois como “Mãe Menininha do Patuá”, a fim de dizer que o segredo de sucesso das músicas do cantor e compositor Veloso, que é ateu, se devia, segundo teria dito o próprio cantor, à prévia bênção da religiosa.[14]

Bibliografia

  • Silveira, Renato da, Candomblé da Barroquinha, Editora: Maianga ISBN 8588543419
  • Herskovits, Melville J., The Human Factor in Changing Africa, 1962
  • Verger, Pierre Fatumbi. Dieux D’Afrique. Paul Hartmann, Paris (1ª edição, 1954; 2ª edição, 1995). 400pp, 160 fotos em preto e branco, ISBN 2-909571-13-0.
  • Verger, Pierre Fatumbi, Notas Sobre o Culto aos Orixás e Voduns. 624pp, fotos em preto e branco. Tradução: Carlos Eugênio Marcondes de Moura EDUSP 1999 ISBN 85-314-0475-4

Referências

  1. ↑ Ir para:a b c «Morte de Mãe Menininha do Gantois completa 25 anos neste sábado». G1. Consultado em 22 de agosto de 2018
  2. ↑ Ir para:a b c Pai Rodney (ed.). «Mãe Menininha do Gantois e o poder dos terreiros». Carta Capital. Consultado em 22 de agosto de 2018
  3. ↑ Ir para:a b c d «Mãe Menininha do Gantois». UOL Educação. Consultado em 22 de agosto de 2018
  4. ↑ Ir para:a b c d e f Carneiro, Edison (1961). Candomblés da Bahia. Bahia: Martins Fontes. p. 400. ISBN 9788578270018
  5. ↑ Ir para:a b CHRISTIANNE GONZÁLEZ, ed. (16 de outubro de 1998). «Morre aos 67 sucessora de mãe Menininha». Folha de São Paulo. Consultado em 22 de agosto de 2018
  6. ↑ Ir para:a b Nóbrega, Cida; Echeverria, Regina (2006). Mãe Menininha do Gantois: uma biografia. Rio de Janeiro: Ediouro. p. 279. ISBN 9788578270018
  7.  «Dados biográficos». Uniafro. Consultado em 22 de agosto de 2018
  8.  «Mãe Menininha». Fundação Gregório de Mattos. Consultado em 22 de agosto de 2018
  9.  Oscar Henrique Cardoso (ed.). «Mãe Menininha do Gantois, história de amor pelos orixás e pela Bahia». Fundação Cultural Palmares. Consultado em 22 de agosto de 2018. Arquivado do original em 2 de agosto de 2007
  10.  «Mãe Menininha». Cultura Black. Consultado em 22 de agosto de 2018[ligação inativa]
  11. ↑ Ir para:a b «Mãe Menininha do Gantois». IstoÉ. Consultado em 22 de agosto de 2018
  12.  Mocidade Independente de Padre Miguel (ed.). «Mãe Menininha do Gantois». Galeria do Somba. Consultado em 22 de agosto de 2018
  13.  «Marco Feliciano ataca novamente: o alvo agora é Veloso». Revista Rolling Stones. Consultado em 22 de agosto de 2018
  14.  «Em novo vídeo, Feliciano insinua que Veloso fez pacto com diabo». O Globo. Consultado em 22 de agosto de 2018

Ligações externas

  • Relato de Ebomi Cidália, filha de santo de Mãe Menininha[ligação inativa]
  • Lei Nº 3590 de 30 de novembro de 1984 do Município de Salvador. Cria, delimita e institucionaliza, como área sujeita a regime específico na subcategoria Área de Proteção Cultural e Paisagística, a área do candomblé Ilê Iyá Omin Axé Iyamassê (Terreiro do Gantois) e dá outras providências.
  • A mãe da sabedoria – reportagem sobre a vida de Mãe Menininha do Gantois
  • O Discurso da Luz (Imagens das Religiões Afro-Brasileiras no Arquivo do Jornal A Tarde), Cleidiana Patrícia Costa Ramos

Anexo 1:

Ialorixá

Fonte: Wikipédia

Ialorixámãe de terreiro,[1] iyalorixá,[2][3][4][5][6] iyáialaorixá ou mãe de santo[7] é a sacerdotisa de um terreiro, seja ele de Candomblé, Umbanda ou Quimbanda.

Etimologia

Iyá, na língua yorubá, significa mãe: (pronúncia ) a junção iaiá ou yayá significa “mamãe”, forma carinhosa de falar com a mãe, ou com a senhora da fazenda, muito usada pelos escravos. É uma palavra utilizada em muitos segmentos das religiões afro-brasileiras, principalmente no candomblé. Pode ser usado antes de uma palavra, como é o caso de iyabassê ou iyá-bassê,[8] Iyá Kekerê[9][10]iyalorixá[11], Iyá Nassô, como pode se usar a palavra para se referir às Iyámi (minha mãe), também chamadas de Iyami-Ajé (minha mãe feiticeira) ou Iyami Agbá[12](minha mãe anciã).

Descrição

Ela é a responsável por tudo que acontece no terreiro, ninguém faz nada no terreiro sem sua prévia autorização. Sua função é sacerdotal: ela faz consultas aos orixás através do jogo de búzios, uma vez que no Brasil não temos o hábito de consultar o babalaô, que é o sacerdote supremo do jogo de Ifá, devido à ausência do mesmo na tradição afro-brasileira desde a morte de Martiniano do Bonfim. Segundo os mais antigos, foi por volta de 1943 que faleceu o último babalaô sacerdote supremo do culto de Ifá no Brasil, e, desde então, não há mais participação ativa de um babalaô nos ritos.

Ialorixás do candomblé: ao centro, Mãe Olga do Alaketu

Durante esse período, o professor Agenor Miranda era convocado para fazer o jogo para saber dos orixás quem seria a mãe de santo nos grandes terreirosbaianos. Com os avanços tecnológicos e com a imigração voluntária de africanos para o Brasil, começaram a surgir novos babalaôs na tradição do candomblé. Necessário se faz diferenciar o jogo de Ifá do jogo Merindelogun e jogo de búzios.

Conta com a ajuda de muitas pessoas para a administração da casa,[13]sendo que cada um tem uma função específica na hierarquia, mas todos sabem fazer de tudo para um caso de emergência. A responsabilidade, a quantidade de filhos de santo, de clientes, e a quantidade de problemas a serem resolvidos num terreiro grande não se comparam ao de uma casa menor. Motivo pela qual a ialorixá das grandes casas conta com a ajuda de um grupo de auxiliares.

Já nas casas menores, a iyalorixá, além da função sacerdotal, acumula diversas outras funções, devendo ser conhecedora das folhas sagradas, seus segredos e aplicações litúrgicas. Em caso de rituais ligados aos eguns, ou se especializa ou consulta um Ojé. Quando necessário, quando a casa ainda não tem um axogum confirmado, ela mesmo faz os sacrifícios. Quando a casa ainda não tem alabê, normalmente a ialorixá convida alabês das casas irmãs para tocar o candomblé. Na ausência da iabassê ou equede, ela mesmo faz as comidas dos orixás, costura as roupas das iaôs, faz as compras etc. As ialorixás mais populares, conhecidas e que se destacaram foram Mãe Olga do Alaketu,[14][15][16] Mãe Aninha, Mãe Senhora e Mãe Menininha do Gantois.

Mães de Santo falam na Abertura da Conferência Regional das Américas sobre os Avanços do Plano de Ação contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Intolerâncias, em 2006, em Brasília

 

 

Anexo 2:

Gantois

Sociedade São Jorge do GantoisTerreiro do Gantois ou Ilê Iyá Omin Axé Iyá Massê, é um terreiro de candomblé brasileiro em Salvador, especificamente no bairro da Federação. Foi tombado nacionalmente em 2002 pelo IPHAN, sob o processo n.º 1471-T-00, 2002.[1]

Essa é outra grande casa de candomblé Nagô (Aláketú), que também nasceu da Casa Branca do Engenho Velho, foi fundado por Maria Júlia da Conceição Nazaréem 1849. [2]

O nome Gantois(pronuncia-se gantoá) tem origem na cidade natal (Gante, Bélgica) do dono do terreno onde o templo religioso foi construído.

O que diferencia o Gantois de outros terreiros tradicionais da Bahia, como o Ilê Axé Opô Afonjá, Casa Branca do Engenho Velho, Terreiro do Bogum e outros, é que a sucessão se dá pela linhagem e não através de escolha pelo jogo de búzios.

De acordo com o antropólogo Julio Braga: “Historicamente, o Gantois é um candomblé familiar de tradição hereditária consanguínea, em que os regentes são sempre do sexo feminino”, em entrevista fornecida ao Correio da Bahia.

Sacerdotisas

As sacerdotisas que chefiaram o terreiro estão listadas abaixo com o período que exerceu o cargo entre parênteses.

  • Maria Júlia da Conceição Nazaré (1849-1910)
    • Jacinto da Conceição
  • Pulchéria Maria da Conceição (1918)
  • Maria da Glória Nazareth (1918-1920)
  • Mãe Menininha do Gantois (1922-1986)
  • Mãe Cleusa Millet (1989-1998)
  • Mãe Carmem (2002)

Referências

  1.  RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS LEI 10.639/03 pág. 15
  2.  Entre a oralidade e a escrita: a etnografia nos candomblés da Bahia Por Lisa Earl Castillo

Ligações externas

Biografia revê o mito Mãe Menininha

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/

Livro revela como a mãe-de-santo vivia antes do sacerdócio e relembra sua influência sobre políticos e artistas da MPB

Autora vai além da imagem pública da ilustre filha de Oxum da Bahia, sempre rodeada de políticos, escritores e artistas

Agência A Tarde
A cantora Maria Bethânia e a ialorixá em seu quarto, no terreiro do Gantois

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

“Menininha foi a primeira mãe-de-santo pop.” O vaticínio do ministro/cantor/compositor Gilberto Gil, em depoimento à jornalista Regina Echeverria, sintetiza a principal imagem que resta após a leitura de “Mãe Menininha do Gantois”, recém-lançada biografia da ialorixá, assinada por Echeverria e a pesquisadora Cida Nóbrega.
O livro, no entanto, vai além da imagem pública e midiática da ilustre filha de Oxum, sempre rodeada de políticos do naipe do hoje senador Antonio Carlos Magalhães, ou medalhões da MPB como Gil, Caetano Veloso, Maria Bethânia e Gal Costa. E ainda os compositores Vinicius de Moraes e Dorival Caymmi, que a imortalizaram nas canções “Tatamirô” e “Oração para Mãe Menininha”.
A biografia recupera as origens históricas e pessoais, retomando os caminhos que transformaram a mulher Maria Escolástica da Conceição Nazareth (1894-1986) num mito.
Echeverria ressalta que o livro revela como Mãe Menininha ganhava sua vida antes do sacerdócio, costurando ou vendendo doces e vísceras em tabuleiros. Explica por que o terreiro se chamava Gantois, sobrenome de um belga, traficante de escravos e antigo proprietário da área onde fica o barracão da mãe-de-santo. E sugere como a resistência pacífica dos negros, e, em especial, a capacidade de fazer alianças da ialorixá biografada, durante os anos de perseguição policial ao candomblé, inspiraram e se incorporaram à política nacional.
“O candomblé segurou a barra do negro no Brasil, ajudando-o a manter sua cultura, por meio do culto aos seus ancestrais. E ele até hoje deixou marcas, como a aliança, o conchavo e a negociação, na política brasileira”, observa a jornalista

Chamamento
Mais de 60 depoimentos, fora reproduções de entrevistas de periódicos diversos, servem à reconstrução da trajetória de Mãe Menininha, descendente de escravos, que nasceu em 1894, em Salvador, já fadada, contam suas biógrafas, a se tornar ialorixá do Gantois.
Depois que sua tia-avó, a ialorixá Pulquéria, morreu, Maria Escolástica tentou escapar do destino. Casou-se, teve duas filhas, morou longe do terreiro, mas lá voltou, aos 28 anos, por chamamento dos próprios orixás: “Primeiro foi Oxóssi, depois Xangô, Oxu, Obaluaê. Eles que me deram este cargo de felicidade, que estou ocupando até o dia que Deus quiser, e Oxalá”, conta ela em entrevista reproduzida no livro.
A biografia também traz passagens bem-humoradas, como a exceção que a mãe-de-santo abria para Vinicius fumar e beber no terreiro. Ou o depoimento do jornalista e produtor Nelson Motta que, “apavorado, meio paranóico”, foi a Salvador pedir proteção à ialorixá. No caminho do aeroporto para a cidade, “num fusca dirigido insanamente pelo motorista”, escapou de um acidente.
“À tarde, fui visitar Mãe Menininha e contei-lhe, dramaticamente, a história. Ela riu muito e me disse: “Que felicidade, não é meu filho? Aconteceu tudo e não aconteceu nada!” E continuou a rir.”
Echeverria também traz à tona uma insólita e divertida faceta da mãe-de-santo: seu fascínio pela televisão. Fã de Chacrinha, a quem ela atribuía um “erê” -estado posterior ao transe do orixá, caracterizado por humor alegre e infantil, como explica o glossário-, Mãe Menininha deixava o aparelho sempre ligado.
“Ela via coisas na TV que associava ao jogo de búzios, às consultas. Uma vez chegou a dizer que o Mogli [personagem do desenho infantil da Disney] era Oxóssi”, conta a biógrafa.
Por fim, o livro relembra os anos de doença e revela um personagem que teria ficado “à sombra” na trajetória da ialorixá. A filha-de-santo Alabá, criada desde os quatro anos de idade no terreiro do Gantois. “Ela era o anjo da guarda que fazia tudo para Menininha, que faleceu poucos dias após a morte dela, pois não via motivo para continuar vivendo. Havia perdido seu grande apoio.”


MÃE MENININHA DO GANTOIS, UMA BIOGRAFIA
Autoras:
 Regina Echeverria e Cida Nóbrega

 

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